Armando Ferreira – Sorte Grande (30 Contos por 10$00) Livraria Editora Guimarães & C.ª – Lisboa – 1942 .Desc. 216 pág / 19 cm x 12,5 cm / Br. «1 Edição»
Armando Ferreira Escritor 1893-1968 Armando da Silva Ferreira, escritor, jornalista, engenheiro e professor do ensino técnico nasceu em Lisboa a 25 de Fevereiro de 1893. Frequentou o Instituto Superior Técnico, onde obteve o diploma de engenheiro, em 1918. Foi assistente neste Instituto e nesse mesmo ano, foi nomeado engenheiro do Ministério da Agricultura. No ano seguinte foi convidado a ocupar o cargo de secretário da «Anglo Portuguese Telephone (vulgarmente conhecida por Companhia dos Telefones) onde esteve durante longos anos. Foi também professor do Instituto Industrial de Lisboa e director da revista técnica Indústria e Ciência. Mas o exercício destes cargos não perturbou o gosto que manifestou, desde muito cedo, pela literatura e pelo jornalismo. No ano da sua licenciatura entrou como redactor para o jornal A Capital, onde esteve durante sete anos, até 1925, tendo chegado a chefe de redacção. Colaborou no folhetim das terças-feiras do Comércio do Porto e manteve outras colaborações assíduas em diversas publicações, tais como ABC, Século Ilustrado, Risota, Civilização, Dominó, Gazeta dos Caminhos-de-ferro, Ilustração Portuguesa, Jornal da Europa, Zé (1914-1915), entre outros. Considerado um digno continuador do estilo de Gervásio Lobato 1 e André Brun 2, que chegou a ser seu colega de redacção, a sua numerosa obra literário estendeu-se aos mais diversos géneros literários, tendo alcançado fama de humorista dos mais populares. Escreveu artigos, crónicas, folhetins, contos e versos entre os quais se contam: Pirilampos (versos), 1911; Rosário (versos), 1912; Era uma vez (contos), 1915; À la minute… (contos), 1916; Guida (romance), 1916; Contos do Vigário, 1917; Do amor à loucura (novela), 1917; A menina dos olhos castanhos (novela), 1917; Os humildes (contos), 1917; Da vida que passa (contos), 1918; Contos maduros, 1918; Crónicas de Viagem, 1922; O meu crime (folhetins de A Capital), 1923; Tito e Tátá, no país da fantasia (literatura infantil), 1928; Branco e Negro (contos), 1929; Contos escuros, 1931; Nau Catrineta (literatura infantil), 1931; Contos alegres, 1932; A Casa do Diabo (policial), 1933. Dentro do género humorístico, onde obteve grandes triunfos, Armando Ferreira foi autor de várias obras: Amor de Perdigão, 1938; A Família Piranga, 1939; As Aventuras de D. Martinho de Aguilar em Lisboa, 1939; A Barata Loira, 1941; Glória, 1941; Um livro de Graça, 1942; Sorte Grande, 1942, Os meus fantoches (contos), 1943, Coisas da Maria Rita, 1944, Remédio das Caldas (romance humorístico), 1944, prefácio à organização da Antologia de Humoristas Portugueses, Falecidos até 1945; Caixinha de Rapé (Filosofia dos que riem, 1946; Fortuna (Romance Alegre de Costumes Populares), 1947; Antologia de Humoristas Franceses, Italianos, Húngaros e Portugueses Contemporâneos, 1948. Como autor, Armando Ferreira legou-nos uma obra em que revisita sobretudo temas camilianos. Até nos títulos escolhidos se encontra a influência de Camilo. Nomeadamente, as Aventuras de D. Martinho de Aguilar em Lisboa um (quase) trocadilho das «Aventuras de Basílio Fernandes Enxertado» e o Amor de Perdigão. Escreveu Lisboa sem camisa, uma popularíssima e sensacional série publicada a partir dos anos 30 onde fazia um retrato caricaturado de figuras e costumes lisboetas. Pegando na história do personagem Moisés Antunes, cujo nascimento e baptizado tinham sido descritos na obra “Lisboa em Camisa”, de Gervásio Lobato, Armando Ferreira desenvolveu a sua vida na trilogia Lisboa sem camisa composta por O Casamento de Fifi Antunes, 1935; O baile dos Bastinhos, 1936 e o Galã de Alcântara, 1937. 3 Beco do Alegrete, ou Crónicas Alegres Lisboetas publicado em 1957 reúne algumas crónicas escritas no Diário Popular. No prefácio, ou como o autor lhe chama Conferência de Imprensa, refere que “este livro editado por Guimarães Editores, com 208 páginas, capa em boa cartolina, desenho do artista Stuart Carvalhais, e que se venderá por uma ninharia, coloca-se na obra do autor como novidade entre os géneros literários que… aflorou. Não é, como anteriormente, romance alegre ou ramalhete de contos humorísticos, nem livros de máximas piadéticas, mas repositório de crónicas citadinas, que entronca o caso de hoje no interesse de sempre, enlaça o efémero de um acontecimento real na perenidade dos tipos imaginados, de forma que qualquer semelhança entre as figuras do texto e pessoas conhecidas… foi de propósito que se procurou sugerir ou insinuar. O autor que se encontrava roendo a sua reforma literária foi solicitado, devido à falta no mercado de comentadores alegres entre as aves de pena, a regressar às lides do jornalismo, e este livro, como diria um critico de há cem anos, é o «escrínio onde o Futuro encontrará conservados os frutos de uma observação irónica e… semanal à vida do nosso tempo, e que, doutra forma, o vento do esquecimento levaria para sempre.» Armando Ferreira explica ainda a razão do livro se chamar Beco do Alegrete: “Titulo subjectivo e simbólico. O autor nasceu lá mesmo, entre os refolhos apertados do olhinho da alface, e, como alfacinha da gema, ama esses tipos, lugares, costumes entre os quais poetizou e viveu a sua vida. O Beco pode ser mal iluminado e exalar cheiros ; gosta dele como se gosta de queijo gruyère, embora também cheio de buracos. Fica situado… no extremo do bairro; é recolhido, pitoresco, e, nos últimos tempos, tem sido muito visitado por curiosos estrangeiros para tirarem fotografias às inovações típicas que à pressa se põem em prática para lhe quebrar o encanto do seu isolamento, da sua sinceridade e poesia.” Algumas das suas obras têm como cenário a cidade de Lisboa, que Armando Ferreira descreve com bastante humor e graça. Nas Aventuras de D. Martinho de Aguilar, da Livraria Editora Guimarães, por exemplo, faz referencia às diversas colinas da cidade: “À esquerda, avançado sobre o horizonte, o 4 maciço onde o Castelo de S. Jorge assentava suas largas bases. As casas pobres marinhavam pelas encostas, mal deixando lugar às árvores, como musgo nas pedras históricas. Ao longe, o rio, e velas pandas andavam lentas parecendo paradas. Mas a atracção maior era o mar de telhados, em ondulação caprichosa pela natureza do terreno, labirinto de vidas ricas e vidas , iguais na amálgama que faz o povoado. Um ou outro bloco isolado, enorme quartel, hospital ou fábrica, e no limite do horizonte a silhueta recortada de uma basílica em curvas equilibradas a contrastar com as linhas rectas das empenas, dos telhados e dos terraços. D. Martinho dizia: As sete colinas afinal devem ser dezoito ou mais… Mas é o que dá graça a este panorama.” Numa carta que D. Mariquinhas escreve a seu pai Mateus Vicente a contar os seus passeios com o se padrinho, D. Martinho, em Lisboa, descreve esta cidade, as pessoas e os seus costumes e compara-as com a sua aldeia: “Há também grandes lagos com repuxos, na praça grande, o Rossio cá da terra, mas também por causa das economias, nunca deitam água. (…) Há jardins bonitos onde brincam os meninos, alguns em carrinhos; o padrinho descobriu que eram todos estrangeiros, porque os nascidos cá, são criados com todos os cuidados, em casa, para não se constiparem. (…) No entanto, o maior e o mais bonito, é o Campo Grande; como é muito grande não vai para lá ninguém, com medo de se perderem. Preferem todos acotovelar-se nas ruas estreitas e sem árvores cá do centro da cidade” campo do Teatro, escreveu várias peças de teatro, Nuvem que passa, em 1914, Avalanche, no teatro da Trindade, em 1922 e As três pancadas, em colaboração com Abreu e Sousa, em 1933. Fez parte do júri de peças de teatro do S. N. I. (Secretariado Nacional de Informação) e de peças para a Emissora Nacional. Foi ainda crítico teatral em várias publicações como A Capital, o Notícias Ilustrado, o Jornal do Comércio e o Diário Popular. Em 1958, passou a ser administrador da Companhia Amélia Rey Colaço – Robles Monteiro. 5 “Espírito culto, vivo, saltitante, sempre com sorriso nos lábio, um lampejo no olhar, um trocadilho na ponta da língua, um livro em perspectiva” 3 Armando Ferreira faleceu a 3 de Dezembro de 1968. Deixou uma obra ímpar, tendo alcançado as mais altas tiragens do mercado livreiro português. Até ao fim da sua vida conservou a frescura, a vivacidade, o interesse, o gosto pela boémia. Como costumava dizer “Na vida o mais difícil de fazer, é não fazer nada”. Por isso trabalhou sempre, até ao fim.