Glória – Biografia de J. C. Vieira de Castro

Glória - Biografia de J. C. Vieira de Castro
Glória – Biografia de J. C. Vieira de Castro «€25.00»

Vasco Pulido Valente – Glória – Biografia de J. C. Vieira de Castro – Gótica Editora – Lisboa – 2002. Desc. 478 pág / 23,5 cm x 15 cm / Br.

 

 

José Cardoso Vieira de Castro (Santo Ildefonso, 2 de Janeiro de 1837 — Luanda, 7 de Outubro de 1872) foi um escritor e político português que teve uma carreira meteórica, que terminou com a morte aos 35 anos de idade depois de um crime passional que emocionou os círculos cultos portugueses e brasileiros. Notabilizou-se primeiros pela sua rebeldia na Universidade de Coimbra, de onde foi repetidamente expulso, e depois pelos seus dotes oratórios e ambição desmedida, que lhe valeram uma precoce admissão como sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa e o casamento com uma rica herdeira, filha de um brasileiro enriquecido no comércio do Rio de Janeiro. Vieira de Castro, esse mártir da loucura da honra, foi um dos indefectíveis amigos de Camilo Castelo Branco, cuja obra em muito contribuiu para perpetuação da memória do malogrado escritor condenado pelo assassínio da esposa e por isso degredado em Angola, onde faleceu. Apesar da admiração que os intelectuais portugueses do tempo lhe devotaram, Vasco Pulido Valente, um seu biógrafo, resume-o, contudo, a um dirigente académico com alguma importância; um jornalista menor; um escritor sem talento; um político sem poder; um criminoso e um degredado. José Cardoso Vieira de Castro nasceu em Santo Ildefonso, a 2 de Janeiro de 1837, filho de Luís Lopes Vieira de Castro, desembargador do Tribunal da Relação do Porto, e de Emília Angélica Guimarães. Era sobrinho do deputado setembrista e ministroAntónio Manuel Lopes Vieira de Castro. Fez os seus estudos preparatórios no Colégio de Nossa Senhora da Lapa, na cidade do Porto, ingressando em 1853, aos 15 anos de idade, na Faculdade de Direito daUniversidade de Coimbra. Durante o ano de 1852, vivendo no Porto, conheceu Camilo Castelo Branco, de quem se tornou amigo. Esta amizade perduraria durante toda a sua vida. Dotado de excepcionais dotes de oratória, na Universidade de Coimbra assumiu o papel de líder natural dos estudantes, acabando por se assumir como um influente dirigente académico, encabeçando a contestação estudantil aos professores e à instituição universitária. Foi neste contexto que em 1857, então aluno do 4.º ano, José Cardoso Vieira de Castro se insurgiu violentamente, durante um acto na Sala dos Capelos, contra a Universidade em defesa de Augusto César Barjona de Freitas, que fora preterido, por antipatias políticas, como candidato num concurso interno. Em consequência foi expulso da Universidade, interrompendo os estudos por dois anos, apenas sendo readmitido devido a mudanças políticas entretanto ocorridas. Contudo, o afrontamento público fez dele um herói, catapultando-o a figura nacional, de que os jornais dão notícia, situação da qual irá, depois, procurar retirar ganhos políticos. Por esse tempo Camilo Castelo Branco visita a Casa do Ermo, solar ancestral da família Vieira de Castro, em São Vicente de Passos, Fafe, e fazendo amizades que mantém, posteriormente, com as figuras mais importantes da terra, nomeadamente com o comendador Albino de Oliveira Guimarães e outros a que se refere nas suas obras. Regressado à Universidade em 1859, para frequentar o 5.º ano, continuou o seu afrontamento aos poderes académicos, envolvendo-se em 1860 numa disputa com o chefe dos archeiros, sendo, em consequência, riscado perpetuamente do rol dos estudantes. Nesse mesmo ano de 1860, Camilo Castelo Branco e José Cardoso Vieira de Castro criam vínculos de particular amizade, quando o escritor se refugia na Casa do Ermo, por se encontrar em fuga devido à prática de adultério com Ana Plácido, casada com o brasileiro Pinheiro Alves, num episódio que Camilo Castelo Branco recorda, na sua obraMemórias do Cárcere, escrevendo: Fui de Santo António das Taipas para as cercanias de Fafe, quinta do Ermo, onde me esperava com os braços abertos e o coração no sorriso, José Cardoso Vieira de Castro, Falseei a verdade. Vieira de Castro esperava-me a dormir, naquela madrugada dele, que era meio-dia no meu relógio. Em 1861 Vieira de Castro publica uma biografia do seu amigo Camilo Castelo Branco, muito bem recebida pela crítica, o que o lança como escritor. Dessa obra diz Júlio Dinisserem duzentas páginas invejáveis. Por esta altura, também colabora com diversos jornais, entre os quais o Ateneu e o Nacional. Vieira de Castro, entre 1862 e 1863, foi vice-presidente da Câmara Municipal de Fafe, então liderada pelo conselheiro Joaquim Ferreira de Melo. Neste último ano, depois de ter sido abrangido pela amnistia geral concedida aquando da subida ao trono do rei D. Luís I de Portugal, José Cardoso Vieira de Castro regressa à Universidade de Coimbra para tentar acabar o curso. Ali voltou a encabeçar a contestação estudantil, envolvendo-se na Sociedade do Raio e nos acontecimentos académicos que deram origem à publicação do Manifesto dos Estudantes da Universidade de Coimbra à Opinião Ilustrada do País, ao lado de Antero de Quental, Eça de Queirós e Joaquim Teófilo Braga, e à consequente demissão do reitor Basílio Alberto de Sousa Pinto, o 1.º visconde de São Jerónimo. Foi novamente afastado compulsivamente da Universidade. Readmitido no ano seguinte, conseguiu terminar o curso em 1864, não sem que antes se tivesse envolvido na Rolinada e no protesto contra a presença militar em Coimbra, solidarizou-se com os colegas contra as prepotências da corporação militar, incitando-os a abandonar Coimbra e a concentrarem-se no Porto. Essas movimentações levam à demissão do novo reitor, Vicente Ferrer Neto de Paiva. A fama que tinha granjeado em Coimbra fazem dele um candidato perfeito ao ingresso na vida política. Assim, mal obteve a sua formatura, foi, ainda no ano de 1864, candidato pelo Partido Regenerador numa leição suplementar no círculo de Fafe, sendo eleito. Prestou juramento nas Cortes a 17 de Janeiro de 1865. Estreou-se na oratória parlamentar em Janeiro de 1865, com um discurso defendendo a necessidade de criar uma comissão parlamentar de inquérito à gestão de José da Silva Mendes Leal na pasta da Marinha e Ultramar. Nas eleições gerais de 8 de Julho de 1865 voltou a candidatar-se pelo círculo uninominal de Fafe, sendo eleito deputado e prestado juramento a 19 de Agosto daquele ano. Permaneceu no parlamento durante toda a 15.ª legislatura, embora não fosse assíduo. Em meados de 1865 recebeu uma Carta pública de felicitação, tendo como destinatário o eloquente deputado o sr. Vieira de Castro pelos cavalheiros portugueses naturais de Fafe e residentes no Rio de Janeiro, datada daquele cidade em 23 de Junho de 1865 e assinada por um importante conjunto de emigrantes nortenhos, em que lhe são rasgados os maiores encómios, estabelecendo uma relação com a comunidade emigrada no Brasil, onde tinha parentes ricos e influentes, que depois exploraria. Durante os anos de 1865 e 1866 fez numerosas intervenções, sobre matérias diversas, com predomínio para as referentes às questões políticas de fundo, como os direitos e liberdades e a desamortização da dívida pública, e sobre figuras políticas nacionais e internacionais de renome. Nestas intervenções confirma as qualidades de orador que já se tinham mostrado nas lutas académicas e cívicas, qualidades que, a par da notoriedade que o seu percurso acidentado por Coimbra lhe tinha já granjeado, o catapultaram para os jornais e para a ribalta da cena política. Reuniu os discursos em livro, que posteriormente publicou. Ainda no ano de 1866 foi agraciado com a Comenda de Carlos III de Espanha e admitido como sócio na Academia Real das Ciências de Lisboa. Entretanto, os seus bens de família encontravam-se muito depauperados. Talvez por essa razão, em finais de 1866 embarca para o Brasil com o confessado objectivo de casar com uma herdeira rica. Fez-se acompanhar de uma edição de 10 000 exemplares dos seus Discursos Parlamentares, publicados nesse ano, que pretendia vender lá para resgatar a empenhada Casa do Ermo, pertença da família. No Brasil, instala-se na chácara de primo e comendador José António Vieira de Castro, sendo recebido com honras invulgares, inclusive pelo imperador D. Pedro II do Brasil, que o condecorou com o grau de cavaleiro da Imperial Ordem da Rosa. Viaja extensamente e estabelece contacto com os intelectuais brasileiros mais relevantes da época, nomeadamente com Machado de Assis. O entusiasmo pela sua pessoa era tão generalizado e de tal ordem que os comerciantes portugueses do Rio de Janeiro lhe ofereceram uma coroa de ouro, então avaliada em quatro contos de réis, e foi nomeado presidente honorário do Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro. Na euforia de recepções, palestras e conferências que desenvolve em seu torno, José Cardoso Vieira de Castro acaba por oferecer, a título beneficente, 1 000 Discursos Parlamentares à Real Sociedade de Beneficência da Baía, os quais foram remetidos pelo seu amigo comendador Albino de Oliveira Guimarães, um fafense radicado no Rio de Janeiro, que custeou o despacho dos volumes, no valor de quarenta mil réis. Os restantes exemplares, e ainda a versão impressa de um discurso sobre a Caridade foram distribuídos por diversas instituições beneficentes. Finalmente, a viagem atinge o seu objectivo, quando em 28 de Fevereiro de 1867 casa, na cidade do Rio de Janeiro, com Claudina Adelaide Gonçalves Guimarães, de apenas 15 anos, filha do comendador António Gonçalves Guimarães, natural de Fafe, homem riquíssimo e um dos directores do Banco Rural e Hipotecário do Brasil. A impresnsa da época refere que o comendador Guimarães é o principal capitalista da colónia portuguesa fafense, toda aliás muito notável pelos membros de que aqui se compõe. O casamento teve grande relevo, noticiando a imprensa brasileira que seriam padrinhos o Ministro das Obras Públicas do Império do Brasil e a sua esposa. Os noivos partem então numa longa viagem de núpcias pela América do Norte e Europa, antes de fixarem residência em Moreira da Maia. Porém, à jovem Claudina não agrada o provincianismo nortenho e o casal instala-se em Lisboa, na Rua das Flores, onde cria uma tertúlia que incluía, entre outros, Ramalho Ortigão, António Rodrigues Sampaio e José Maria de Almeida Garrett, um sobrinho dândi de Almeida Garrett. A ascensão social de José Cardoso Vieira de castro continuou, com mais condecorações e com projectos cada vez mais grandiosos, que incluiam a criação de um jornal diário e o reinício da sua carreira política. A amizade com os principais intelectuais garantiam-lhe constantes referências elogiosas na imprensa, ganhando um estatuto de escritor e de intelectual que em pouco corresponde à realidade, pese embora a morte precoce. Nas eleições gerais de 22 de Março de 1868 concorreu pela oposição regeneradora nos círculos de Fafe e de Bouças, não conseguindo ser eleito. Igual desfeccho teve a sua candidatura em 1869 pelo círculo do Porto. Entretanto, o relacionamento com a jovem esposa brasileira foi-se azedando, com ciúmes crescentes e suspeitas de infidelidade que se iam avolumando. No dia 7 de Maio de1870, julgando confirmadas as suspeitas de infidelidade da sua esposa com José Maria de Almeida Garrett, o sobrinho de Almeida Garrett e amigo de casa, acaba por assassinar a jovem, quando esta dormia, usando para isso uma almofada com clorofórmio. No dia seguinte entregou-se às autoridades, confessando o crime. Julgado em Novembro de 1870, foi seu defensor o advogado e intelectual madeirense Jaime Constantino de Freitas Moniz. Era acusado de ter envenenado a mulher, num crime que emocionou a intelectualidade romântica portuguesa e provocou renhidas polémicas. A defesa de Jaime Moniz foi muito apreciada pelos jornais da época e Pinheiro Chagasdedicou-lhe os maiores louvores no seu folhetim da Gazeta do Povo (no n.º 336, de 1871). O discurso de defesa foi publicado no livro Processo e Julgamento, páginas 119 a 137, com o título Alegação de defesa por parte de José Cardoso Vieira de Castro, proferida em 30 de Novembro de 1870, na audiência do julgamento do processo contra ele instaurado pelo crime de homicídio na pessoa de sua mulher. Foi condenado a 10 anos de degredo para Angola, onde morreu em 1872, aos 35 anos de idade, nos arredores de Luanda, vitima de febre fulminante. O talento e o génio de Vieira de Castro foram consumidos no tremendo drama e desastre da sua vida, mas, ainda assim, o seu amigo Camilo Castelo Branco, em homenagem, ainda se refere À memória de José Cardoso Vieira de Castro, que aceitou o degredo e a morte, em desafronta da sua honra de marido.